Em um sábado de sol um letrado e uma comediante decidiram fazer um piquenique. Estenderam a toalha xadrez vermelha no chão e começaram a beber um delicioso cabernet sauvignon. Enquanto isso, algumas crianças brincavam na gangorra. Outras se divertiam em um carrossel enferrujado que gritava por cuidados. Suas engrenagens já não deslizavam como antes. Mas ele estava ali, fazendo o mundo delas girar. Jogando nos olhos rastro de tinta atirada na velocidade do tempo. Antes que o próprio tempo substitua seu efeito por uma garrafa de vinho.
Adultos quando embriagados acham que escutam vozes. Vozes de semente e árvore.
O letrado e a comediante já não sabiam mais o que era verdade e vertigem quando ouviram a semente dizer para outra semente:
Não corra, por favor, não me deixe aqui sozinha, inha, inha, inha...
Só estou contando histórias que observei aqui de baixo. Já vi esta árvore passar por tempestades, (in)certezas. Ela se permitiu ficar de pé por ter longas raízes. Algumas ela faz questão de deixar exposta para que uns tropecem, caiam e olhem para trás para observá-la. Outros até a xingam por isso. Com toda razão, ela provoca, gosta de viver no conflito. São nestas raízes que estou presa. Tenho me alimentado de seus frutos “ácidoce”. Todas as segundas passa por aqui o sarau do besouro zumbi. Eles varam a noite e eu caio no sono profundo. Destes poetas já recebi as flores mais perfumadas. Desta árvore já ouvi muitas e muitas histórias e quem sabe algum dia dividirei com alguém além de você.
- Vá! Disse a árvore para a semente falante.
- Você é livre para ir aonde bem entende. Não precisas de mim para ir a nenhum, nenhum lugar. Não necessitas de minha atenção. Estais presa na raiz desta árvore porque queres.
S - Mas eu sai aí de dentro! Quando eu nasci você era apenas uma árvore atraente. Não és capaz de perceber que precisas de mim?
A - Ora, ora. Já te disse que não precisas de mim. Sementes não ficam eternamente presas na árvore. Algumas sementes ficam adormecidas por algumas estações. Neste período elas são protegidas pela grande árvore. Algumas sementes não suportam a umidade. Acabam virando adubo para que eu possa me alimentar. Outras rolam pelo campo, invadem a estrada do homem e sem querer ele pisa nelas. Esmaga as mesmas.
S - Que triste fim tem estas sementes.
A - A vida é assim mesmo. Aqui do alto posso ver coisas que ninguém vê. Observo atentamente cada passo. Por este motivo meu tronco é coberto de espinhos. Eles impedem a aproximação de estranhos. Estes mesmos espinhos acabam machucando algumas crianças. Muitas delas vêm até mim. Penduram seus balanços em meus braços. Elas dão alegria para os meus dias. Quando você crescer vais entender exatamente o que estou dizendo.
S - Então significa que vou crescer?
A - Sim, você crescerá. Seja uma árvore linda. Mas nunca cresça, cresça, cresça.
S - Por quê?
A - Somos parte da natureza, não somos a natureza. Uma árvore que cresce demais o vento vem e quebra. Permita então que o jardineiro da vida venha e te pode a cada estação. Assim você terá folhas vistosas e frutos saborosos.
E a semente seguiu seu caminho.
S - Talvez eu seja uma semente nômade flertando o vento.
Gabi
sábado, 25 de julho de 2009
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